segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

pauso a leitura para olhar a paisagem.
cidade nova
da janela pareço ver um filme.
estou de frente para a janela.
a estação parece demorar a chegar para que eu possa escrever. tenho medo de esquecer
são cristóvão
já esqueci tudo.
à minha frente o homem que tenta dormir esbarra sem querer em minha perna. percebendo o constrangimento, finjo não perceber.
ninguém cede lugar para leitores e escritores.
não sou acostumada mesmo a regalias.
o maquinista não coopera e a todo instante preciso parar a escrita.
mas sou boa em equilíbrio e firmo forte os pés no chão melado.
não adianta chorar pelo milk shake derramado.
tristeza de alguém, sorte minha, ali me finco e ninguém se aperta por volta de mim.
conjunto habitacional.
a serra
as torres
a janela
queria saber a localização e nome de todas
maria da graça
xuxa aqui não moraria.
sentado há um casal jovem. ele dorme no ombro dela que escuta música e fala com amigas pelo whatsapp.
ao meu lado um homem foge de um grande urso, saltando pontes. uma mão segura-se, outra joga. seu avatar caminha sobre precipícios, usa jeans e um boné azul.
no meio do jogo bia lhe manda uma mensagem: não briga comigo não.
acho que estou próxima ao meu destino mas o letreiro está longe do meu míope alcance. dependo da sexy voz invisível.
toca uma música alegre.
todos parecem tristes.
metrô colorido.
os paulistas não nos levam a sério.

[dezembro-14]

autorretratos

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Cena 3 - Carnaval

Cena:
Noite. Domingo de Carnaval. Chove. O guarda-chuva grande combina com a cor dos cabelos dela. Ainda que não seja a mesma - a cor, ela. Ninguém pára os táxis. Ninguém vende sakê. Caminha e encontra amigos coloridos e molhados de chuva. Peitos nus, unhas postiças. É a senhora dos absurdos? Fica encantada com a beleza do novo loiro. Parece estrela. Ninguém pára táxis. Ninguém vende sakê. O metrô sentido zona norte é uma babilônia. Gritos, multidão, ameaça de brigas. Álcool. Ela não tem uma gota nas veias. Uma mulher passa gritando: Não estou aguentando! Seu acompanhante a alerta que a saída é pro outro lado. Raquel (meu codinome beija-flor) desce as escadas aliviada de ver que o sentido para onde vai está calmo e tranquilo. (De tudo isso, qual é o sentido?) A mulher, que antes gritara, parece querer aliviar-se também e, sem cerimônias, agacha-se no topo da escada que dá acesso à plataforma, abaixa a calcinha e... mija. Guardas desconcertados se falam pelo rádio, mas nenhum é capaz de interromper o fluxo natural daquela mulher que já não aguentava mais. Ao final o guarda sobe, ela corre, entra no vagão e parte, espremida aos demais foliões que cantam. Do lado de cá chega também o metrô colorido do Rio. Rio.

raquel mirando